quarta-feira, 29 de abril de 2009

grito-me


"E talvez meu desejo de outra fonte, essa ânsia que me dá ao rosto um ar de quem caça para se alimentar, talvez essa ânsia seja uma idéia – e nada mais.


Porém – os raros instantes que às vezes consigo de suficiência, de vida cega, de alegria tão intensa e tão serena como o canto de um órgão – esses instantes não provam que sou capaz de satisfazer minha busca e que esta é sede de todo o um ser e não apenas uma idéia? Além do mais, a idéia é a verdade!
Grito-me.”
de Clarice Lispector
e a foto é minha. uma cena na casa da Renata.

Amamentar é, também, um ato de amor

Esse vídeo me emocionou. Achei lindo, simples e poético.
Como mãe, e mamífera, compartilho deste amor, que a tela nos mostra com tanta leveza e naturalidade.
Acredito no aleitamento materno.
O melhor alimento que seu filho pode ter, durante os primeiros anos de vida.
Leite, seios, lábios, amor.
Vida.
Saúde.
Viva!

segunda-feira, 27 de abril de 2009




“...e não me reste de tudo, ao fim


Senão o sentimento desta missão e o consolo de saber


Que fui amante, e que entre a mulher e eu alguma coisa existe


Maior que o amor e a carne, um secreto acordo, uma promessa


De socorro, de compreensão e de fidelidade para a vida.”


- Vinícius de Morais -


A foto é do Bil - e eu sou a modelo, grávida do Be

A Barca Turista aprendiz

Um projeto que inspira.
De raizes sólidas, de criatividade e qualidade.
Voltemos a elas, para aprender e reproduzir o que há de bom.
Para que façamos música, todos, na sintonia boa de compartilhar a cultura popular brasileira.
Dança, música, poesia e religiosidade, no mesmo passo dos tambores.

Parabéns para A Barca. Trabalho íntegro desde sempre.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

viroses do início do outono

Feriado de virose. Bernardo com febre.

Estamos agora no fim do ciclo. é preciso paciência para esperar o processo de amadurecimento do corpo. Uma coisa que aprendi foi a encarar as doenças infantis como processos de fortalecimento do organismo. De aprendizagem.

Aprendi a superar meus medos maternos, e confiar no meu filho.

Claro, estou com ele nessa jornada, lado a lado, com todo meu amor.



O menino doente
O menino dorme.
Para que o menino
Durma sossegado,
Sentada ao seu lado
A mãezinha canta:
— "Dodói, vai-te embora!
"Deixa o meu filhinho,"
“Dorme . . . dorme . . . meu . . ."
Morta de fadiga,
Ela adormeceu.
Então, no ombro dela,
Um vulto de santa,
Na mesma cantiga,
Na mesma voz dela,
Se debruça e canta:
— "Dorme, meu amor."
Dorme, meu benzinho . . . "
E o menino dorme.


De Manuel Bandeira

A foto é do Bil. Eu e Bernardo, conectados pela amamentação.

sábado, 18 de abril de 2009

vermelho gente

Em Brasília, admirei.
Não a niemeyer lei,
a vida das pessoas, penetrando nos esquemas
como a tinta sangue no mata borrão,
crescendo vermelho gente,
entre pedra e pedra, pela terra a dentro.(...)
carrego o peso da lua,
três paixões mal curadas,
um saara de páginas, essa infinita madrugada.
Viver de noite me fez senhor do fogo.
a vocês, eu deixo o sono.
O sonho, não.
Esse eu mesmo carrego"

Leminski
A foto é minha. Exposição de arte para crianças no CCBB-Brasília

sexta-feira, 17 de abril de 2009

sonhos, sonhos......


No início tudo é sonho.
No início os sonhos são somente sonhos, sozinhos, habitantes de um mundo distante.
No início os sonhos são esperanças.
Depois começam, tímidos, a tomar corpo, a ficarem visíveis, quase palpáveis.
É quando, então, começa-se a acreditar neles.
É quando eles se tornam amigos, únicos, insubstituíveis.
Sonhos são então possibilidades, que alegram o dia, que movem as pernas, que impulsionam o corpo.
São o verdadeiro motivo, a verdadeira espera, o verdadeiro caminho.
São agora próximos, vizinhos.
Caminham passo a passo,
Dividem nossos anseios, nossa volúpia, nossas vontades mais secretas.

Sonhos vão crescendo, proliferam-se na escuridão, tomam conta do espaço vazio do quarto quando apagamos a luz.
É preciso cultivá-los, fazê-los prosperar, plantá-los nas ruas, nos jardins, nas árvores.
Sonhos, são, quem sabe, o que seremos amanhã, o que deixaremos para o mundo, o que será continuado por outro sonho desconhecido.
Sonhos são inocentes, assustados.
É preciso segurá-los, não lhes deixar escapar por entre os dedos, por entre a vil realidade, opressora.
Sonhos são o que nos aproximam de verdade das demais pessoas, tornando-as parte da nossa alma, da nossa loucura, da nossa lucidez.
Sonhos se revelam, esclarecem mistérios, nos fazem compreender o que normalmente não compreenderíamos.
Sonhos são forças, são deuses, são a própria essência, disfarçada, brilhante, colorida.
Sonhos não tem fim, ou melhor, são o próprio fim.
A memória é fraca, a vida é fraca.
No fim, por certo, tudo acaba. E no fim tudo é sonho

Escrevi fazem alguns anos.
E a foto tirei faz pouco, em casa. Be num momento de liberdade.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Cada um de nós é por enquanto a vida




"Na ilha por vezes habitada do que somos, há noites, manhãs e madrugadas em que não precisamos de morrer. Então sabemos tudo do que foi e será. O mundo aparece explicado definitivamente e entra em nós uma grande serenidade, e dizem-se as palavras que a significam. Levantamos um punhado de terra e apertamo-la nas mãos. Com doçura. Aí se contém toda a verdade suportável: o contorno, a vontade e os limites. Podemos então dizer que somos livres, com a paz e o sorriso de quem se reconhece e viajou à roda do mundo infatigável, porque mordeu a alma até os ossos dela. Libertemos devagar a terra onde acontecem milagres como a água, a pedra e a raiz.
Cada um de nós é por enquanto a vida. Isso nos baste."

De José Saramago

E a foto é minha. Be e Theo.

terça-feira, 14 de abril de 2009

O Direito Achado na Rua

“Kant e Fichte buscavam o país distante
pelo gosto de andar lá no mundo da lua,
mas eu tento só ver, sem viés deformante,
o que pude encontrar bem no meio da rua”
(Roberto Lyra Filho, Desordem e Processo).


A foto é minha - coisas do céu de Brasília

uma partida

Minha avó patena faleceu no final do ano passado. Ela tinha pavor de médico. Sentia um caroço crescer no seu seio. O caroço crescia, crescia. Ela tinha 85 anos. Não falou nada pra ninguém. Emagreceu, perdeu o apetite, mas continuou a viver a sua vidinha, cercada pelas pessoas que gostava, fazendo o que gostava, e em silêncio sobre o tumor que tomava conta de seu seio. Passaram- se meses. Nem uma palavra. Ela continuou fazendo seu tricô, cozinhando, cercada pelos netos, sentada na sua cadeira perto da janela, onde via o mundo, e o mundo passava por ela. Até que ela parou de comer, e começou a se sentir fraca. Foi quando pediu ajuda. Quando estavam a caminho do hospital, ela disse para a minha tia: "eu tenho câncer". Minha tia achou que ela não estava batendo bem. Chegaram no hospital. Quando a entubaram, ela desligou do mundo. Passou dois dias na UTI. Quando chegou o resultado do exame (câncer, sim, que havia se espalhado pelo seu corpo adentro) ela já estava morta. Nunca ouviu o diagnóstico da boca de nenhum médico, não fez um exame, não perdeu um fio de cabelo. Pergunto: se ela tivesse se submetido a um tratamento quimioterápico, ela estaria viva hoje? Foi difícil para os filhos aceitarem a escolha dela. Eu a admirei como nunca.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

radicais do pouco


“Sim, todos vos que representais o mundo,
homens altos passai por baixo do meu desprezo
Passai, aristocratas de tanga de ouro,
Passai frouxos
Passai radicais do pouco!
Quem acredita neles?
Mandem tudo isso para casa, descascar batatas simbólicas
Fechem-me isso a chave e deitem a chave fora.
Sufoco de ter só isso a minha volta.
Deixem-me respirar!
Abram todas as janelas
Abram mais janelas do que todas as janelas que há no mundo.
Nenhuma idéia grande, nenhuma corrente política que soe a uma idéia grão!
E o mundo quer a inteligência nova
O mundo tem sede de que se crie
O que aí está a apodrecer a vida, quando muito, é estrume para o futuro.
O que aí está não pode durar porque não é nada.
Eu, da raça dos navegadores, afirmo que não pode durar!
Eu, da raça dos descobridores, desprezo o que seja menos que descobrir o mundo novo.
Proclamo isso bem alto, braços erguidos, fitando o Atlântico
e saudando abstratamente o infinito.”

De álvaro de campos
E a foto é minha. Numa ida ao circo.

sábado, 11 de abril de 2009

paulista também tem samba no pé

Quinta-feira nos aventuramos e conseguimos assistir a um show.
KikoDinucci e Bando afromacarrônico, no espaço Brasil Telecom.
Estamos escutando muito esses dias.
E que delícia de show. Bernardo dormiu no meu colo, e quase no final do show já estava difícil mantê-lo assim. Ficou inquieto. Mas o som dos tambores estava afinado, fiquei grudada na cadeira, dançando como podia.
Deu saudade dos batuques de São Paulo, dos espaços, dos amigos.
Saudades das noites inusitadas, das luzes que não se apagam, dos bares que não fecham, das festas nas casas dos amigos, e das rodas de samba paulista, sempre alegres e com muito samba no pé.

Aqui o link para um vídeo dos caras: http://www.youtube.com/watch?v=l9b1RCpe3Pc

"Sinto falta de São Paulo
De escutar na madrugada
Uns bordões de violões, e uma flauta a chorar prata"
Faço dos versos de Eduardo Gudin os meus lamentos de hoje.

terça-feira, 7 de abril de 2009

sucedido desgovernado

"o que vale, são outras coisas.
a lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos, cada um com seu signo e sentimento, uns com os outros acho que nem não se misturam. contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo as coisas de rasa importância. de cada vivimento que eu real tive, de alegria forte ou pesar, cada vez daquela hoje vejo que eu era como se fosse diferente pessoa. sucedido desgovernado. assim eu acho, assim é que eu conto.
tem horas antigas que ficaram muito mais perto da gente do que outras, de recente data"

De Guimarães Rosa

coisas de dentro da gaveta

Foto que tirei do Bil, no CCBB Brasília


Faz tempo que escrevi. Mas o sentimento está aí para ser compartilhado.


Hoje eu rezo.
Rezo antes de deitar, uma prece solitária, com a cabeça no travesseiro e os olhos fechados para sentir o escuro.

Que meu coração não saiba que um dia eu chorei por ele.
Que ele não escute um lamento sequer, pois os lamentos são efêmeros quando exteriorizados.
Que meus lamentos sejam silenciosos, contidos, latentes.
Que a minha solidão de hoje seja só minha, como um fruto que colho pelos acontecimentos.
Que a minha dúvida ande sempre paralela, arredia, sucumbente.
Que ele não saiba da sua importância, pois as importâncias são individuais e assustadoras.
Que eu consiga acertar o passo, ajeitar a face, conter os sentimentos.
Que a minha explosão possa se diluir, possa se dissipar antes da tempestade.
E a tempestade, se tiver que vir, que deixe a terra úmida para a próxima colheita.
Que meu amor possa vibrar, possa atingir.
Que ele seja forte para agüentar a humanidade, para assimilar os erros e suportar os acertos.
Que eu descubra que ser mulher é ser humano,
Que a vontade de chorar não passa,
Que a vontade de sorrir não passa,
Que a vontade não passa.
Que eu saiba sentir a sua falta,
Que eu saiba respeitar os momentos da minha própria reclusão.
Que eu conheça as limitações e tenha a paciência necessária para aceitá-las.
Que quando a dor chegue, eu saiba reconhecê-la.
E que, sobretudo, como já aprendi,
Meu largo canto vibre acima dos ódios e ressentimentos,
Das intrigas e vinganças,
Nos espaços infinitos.

Antropologia Jurídica

Os esquimós vivem numa região onde, na época do inverno, o frio mata uma pessoa em cinco minutos se ela não estiver adequadamente vestida. Eles têm sido tradicionalmente caçadores e muitos ainda o são e, no inverno, essa atividade torna-se bastante árdua. Partindo desse fator geográfico básico, os esquimós desenvolveram durante muitos séculos uma série de leis que lhes permite sobreviver num dos ambientes mais hostis da terra. Uma dessas leis é: quem tem excesso de carne ou outro alimento deve reparti-lo com os outros. Armazenar comida é um crime mortal na visão desse povo. Em seu ponto de vista, é natural as pessoas dividirem seus bens. Devido a essa crença, os primeiros comerciantes ingleses nunca puderam instalar um posto comercial em território esquimó. Os esquimós sempre estavam dispostos a repartir as suas peles e alimentos com os ingleses, porém nunca conseguiram entender porque estes mantinham um estoque enorme de mantimentos sem dividi-lo. Tal procedimento não lhes era natural ou, melhor, era “crime”. Por três vezes os ingleses estabeleceram postos comerciais no território esquimó no século passado, e por três vezes, após algumas discussões sobre justiça e divisão, as comunidades esquimós simplesmente mataram os comerciantes ingleses e distribuíram seus alimentos. Isto foi “justo” para o direito esquimó, já que, para eles, o crime mortal não era o roubo e sim a ganância.

De Robert Weaver Shirley



















Foto da Ana Moreira, em frente a FUNARTE - Brasília

segunda-feira, 6 de abril de 2009

O imprevisto improvisado e fatal me fascina

"Está fazendo um dia de sol. A praia estava cheia de vento bom e de uma liberdade. E eu estava só, sem precisar de ninguém. É dificil porque preciso repartir contigo o que sinto. O mar calmo, mas a espreita e em suspeita. Como se tal calma não pudesse durar. Algo está sempre por acontecer. O imprevisto improvisado e fatal me fascina. Já entrei contigo em comunhão tão forte que deixei de existir sendo. Você tornou-se um eu. É tão difícil falar e dizer coisas que não podem ser ditas. É tão silencioso. Como traduzir o silêncio do encontro real entre nós dois? Difícil contar... olhei pra você fixamente por alguns instantes. Tais momentos são meu segredo”
De Clarice Lispector

Isso de querer ser
Exatamente aquilo
Que a gente é
Ainda vai nos levar além – Leminsk
Foto do Bil, em casa

Não se conta tudo porque o tudo é um oco nada

Começar não é fácil
Mas hoje escrever foi quase uma necessidade. Minha caixa postal amanheceu vazia de poesia. Sempre tive interlocutores, e trocas.
Quase uma imperativo, vital.
Trocar. poetizar o cotidiano, extravazar.
Rosa-amor-espinho-saudade.

Meu filho dormiu, e o silêncio invadiu o quarto. Sossego.
Ser mãe já é intensidade suficiente.
Mas, eu quero mais um pouco, nesta noite de ventania.

Como diria Clarice Lispector: "estou infinitamente maior que eu mesma, e não me alcanço".

Mas vamos devagar. Começarei do começo.

Vontade de me contar um pouco através do que leio.
E do que me toca a alma.