A nossa poesia é uma só
Eu não vejo razão pra separar
Todo o conhecimento que está cá
Foi trazido dentro de um só mocó
E ao chegar aqui abriram o nó
E foi como se ela saísse do ovo
A poesia recebeu sangue novo
Elementos deveras salutares
Os nomes dos poetas populares
Deveriam estar na boca do povo
Os livros que vieram para cá
O Lunário e a Missão Abreviada
A donzela Teodora e a fábula
Obrigaram o sertão a estudar
De repente começaram a rimar
A criar um sistema todo novo
O diabo deixou de ser um estorvo
E o boi ocupou outros lugares
Os nomes dos poetas populares
Deveriam estar na boca do povo
No contexto de uma sala de aula
Não estarem esses nomes me dá pena
A escola devia ensinar
Pro aluno não me achar um bobo
Sem saber que os nomes que eu louvo
São vates de muitas qualidades
O aluno devia bater palma
Saber de cada um o nome todo
Se sentir satisfeito e orgulhoso
E falar deles para os de menor idade
O nomes dos poetas populares
.....
Maria Bethânia deu voz e alma a esse poema de Antônio Vieira.
Que deveria estar na boca do povo.
DONA MARIA DO BATUQUE
Essa é a Dona Maria do Batuque.
São sei se ainda está viva, mas é certo que o som dos seus tambores ainda ecoa em São Romão, interior de Minas Gerais, uma pequena cidade esquecida pelo tempo, às margens do Rio São Francisco.
Tive o prazer de conhecê-la durante uma viagem pelo interior do Brasil. Foi uma viagem transformadora, onde tive o privilégio de viver um Brasil que não conhecemos pela televisão e pela realidade das grandes cidades. Um brasil de pé no chão, chão de terra. De dias longos, de horizonte largo, de necessidades que não compreendemos.
Um Brasil humilde, de gente seca pelo clima do sertão. Gente que espera, ajoelha e reza, com resignação. Mas gente de indizível beleza humana. E de grande sabedoria, que não vem com a leitura de livros ou com os ensinamentos da ciência. Sabedoria sobre as coisas da vida, aprendidas pelo simples viver da realidade.
Dona Maria do Batuque leva adiante uma tradição que aprendeu com seus avós: o batuque. Uma tradição popular que leva às ruas da pequena cidade a música e a dança do batuque, para ser compartilhada por todos. Tomamos um café com ela que, junto com seus netos, nos mostrou o que sabia sobre a cultura popular de sua região. Afinou seus tambores, e com a voz rouca pela idade avançada, cantou as canções que vêm de outras gerações. E as crianças, todas, seguiram a mesma melodia popular, batendo os tambores e cantarolando as rimas dos antepassados, tão atuais como as músicas que tocavam no rádio de pilha.
Dona Maria do Batuque deveria estar na boca do povo.