terça-feira, 14 de abril de 2009

uma partida

Minha avó patena faleceu no final do ano passado. Ela tinha pavor de médico. Sentia um caroço crescer no seu seio. O caroço crescia, crescia. Ela tinha 85 anos. Não falou nada pra ninguém. Emagreceu, perdeu o apetite, mas continuou a viver a sua vidinha, cercada pelas pessoas que gostava, fazendo o que gostava, e em silêncio sobre o tumor que tomava conta de seu seio. Passaram- se meses. Nem uma palavra. Ela continuou fazendo seu tricô, cozinhando, cercada pelos netos, sentada na sua cadeira perto da janela, onde via o mundo, e o mundo passava por ela. Até que ela parou de comer, e começou a se sentir fraca. Foi quando pediu ajuda. Quando estavam a caminho do hospital, ela disse para a minha tia: "eu tenho câncer". Minha tia achou que ela não estava batendo bem. Chegaram no hospital. Quando a entubaram, ela desligou do mundo. Passou dois dias na UTI. Quando chegou o resultado do exame (câncer, sim, que havia se espalhado pelo seu corpo adentro) ela já estava morta. Nunca ouviu o diagnóstico da boca de nenhum médico, não fez um exame, não perdeu um fio de cabelo. Pergunto: se ela tivesse se submetido a um tratamento quimioterápico, ela estaria viva hoje? Foi difícil para os filhos aceitarem a escolha dela. Eu a admirei como nunca.

3 comentários:

  1. há tantas coisas que ainda não compreendemos...

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  2. Muito linda a sua inspiração. Acho que foi dificil no momento do acontecimento, mais pela surpresa, pois, não se tinha idéia do que estava acontecendo. Ela realmente conseguiu fazer tudo como ela queria. Hoje dá pra se ver perfeitamente e entender - acho que se nós soubessemos teríamos forçado um tratamento, o que, sem duvida, teria sido uma opção pior, pois, acarretaria em mais sofrimento e um afastamento da vida normal e principalmente da proximidade de todos que a cercavam de modo natural e cotidiano, como ela gostava. Sem duvida, ela foi de uma coragem e determinação incríveis e conseguiu realmente fazer tudo como queria. Que bom, pois, ela merecia, e, na maioria das vezes, as pessoas mais velhas acabam não tendo forças e se submentem a uma vida que elas não gostariam de ter. Hoje, eu fico feliz em saber que ela conseguiu o que queria, apesar do preço que deve ter custado. Porém, da outra maneira, tenho certeza de que teria doído muito mais, principalmente, no coração. Nós devemos tudo a ela e a meu pai, que já havia partido antes, pois, fizeram tudo para nos proporcionar educação e uma base para vivermos de maneira digna e feliz. Não me canso de pensar neles e rezar para que estejam juntos em um lugar maravilhoso que tanto merecem. P.

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  3. isso tudo me lembra minha avó, também levada pelo cancer.
    também no ano passado.
    nunca havia convalescido por nenhuma outra doença antes, mas o cancer a arrebatou e a escolha dela, apesar de diferente da sua avó, foi tardia.
    sinto angustia por ela ter nos deixado sem estar em paz e ainda com muita vontade de viver.

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