terça-feira, 20 de outubro de 2009

a dura e necessária solidão


Nesses tempos muito tenho pensado sobre solidão, amor, relacionamento. Sobre conjugar o eu, meu, com os outros eus. Esse meu eu cheio de vontades e facetas. E os outros eus com demandas e expectativas - justas expectativas - apontadas em minha direção. Encanto-me e assusto-me, ao ver o tamanho do desafio.

Muito venho pensando sobre ser, verdadeiramente. Sobre realizar os próprios impulsos e vocações, rumo ao lugar no qual apenas nos cabe. A cada um, individualmente, nessa dura e solitária viagem em direção a nós mesmos. Necessária para que se possa voltar - só assim inteiro, para o convívio com o mundo.

Venho vivendo. Imersa em afazeres e cuidados que se multiplicam. Imersa em mim e nos que hoje me cercam com tanta intensidade. Disputo-me, com pressa de entender algo que ainda não alcanço. E sempre regida pela martelada seca do tempo que corre, e que vê crescer os amores que me compõem.
Compartilhar, sem me perder de vista: eis o grande desafio.

E, em meio a tudo isso, encontro o Rilke. O Rilke maduro, que no final da vida escreve no livro "o testamento", e nos deixa de presente:

“...
E mesmo mais tarde, mesmo agora, mesmo nestas últimas semanas, não acedi à consciência de minha natural solidão, o único meio de me tornar senhor de mim mesmo. Meu coração deslocou-se do meio de seus círculos em direção à periferia, para o lugar mais perto de ti – por mais que aí ele seja grande, sensível, jubiloso ou timorato, não se acha em sua constelação, não é o coração da minha vida.
Em nossos momentos mais doces e talvez mais justos, amada, asseguraste-me que podias abarcar todos os tipos de amor por mim. Ah, controla-te,..., resume-te àquela que, tenha o nome que tiver, assegura a minha vida, fortalece-me como pode. Não posso escapar de mim mesmo. Pois se eu desistisse de tudo, tudo, e me atirasse cegamente a teus braços, como por vezes desejo, e aí me perdesse, terias contigo alguém que houvera desistido de si mesmo: não seria a mim que terias, não a mim.
Não sou capaz de dissimular e me transformar. Exatamente como na minha infância, diante do violento amor de meu pai, ajoelho-me no mundo e peço indulgência àqueles que me amam. Sim, que me poupem! Que não me consumam para a própria felicidade, mas me assistam a fim de que se desenvolva em mim aquela felicidade mais funda e solitária. Sem a grande demonstração dessa felicidade, por fim, não me haveriam de ter amado”.

Sábio Rilke.

Estudo suas palavras, que me aliviam a alma.

E a foto que tirei na praia de Tibau do Sul - Rio Grande do Norte, hoje me lembra do mar - com aquela boa saudade de olhar a vida que vai e vem, infinitamente.




2 comentários:

  1. Pôxa, Sílvia, que legal seu blog!!!
    Parabéns!

    Jarbas

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  2. tão importantes esses desafios que volta e meia nos tiram do lugar comum e nos fazem renascer.
    vc está mergulhada nessas questões tão íntimas e ao mesmo tempo sem deixar de se doar ao outro, bonita essa passagem sil. boa transformação.

    beijo carinhoso

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