quarta-feira, 8 de junho de 2011

dito-não-dito




Às vezes vem um medo de dizer.

Medo de pronunciar com palavras, afirmar, querer com endereço determinado. O não dito é tão vasto, e nele cabe tanta coisa. Tanta coisa que pode ser, e que não se contorna em limites e possibilidades de nãos. Que me extrapola, e me faz quase onipotente diante de tanta grandeza não realizada.

Não dizer me deixa livre, não me compromete com o que amanhã já não for mais. Com aquele que me ouvir dizer, e for atingido por palavras concatenadas. Solta-me para voar, e para estar sempre só com essas tantas coisas minhas, nunca compartilhadas. Não comprometidas com ninguém, a não ser comigo mesma.

Dizer quase me amarra os pés, parece sufocar o pensamento com frases feitas. Limitadas. Quanto mais real o dito, menos ele cabe na fantasia de céu azul, menos ele voa sem rumo. É como a pipa presa na mão do menino. Voa ali perto, sem possibilidade de adentrar o desconhecido, o impossível, o fantástico sem rumo e sem pé no chão. 

(A menos que bata um vento tão forte que faça a pipa soltar as cordas, ou o menino machucar a mão e soltá-la na imensidão para nunca mais. Sempre existem os ventos, eu sei. Talvez por isso tenha medo de ter uma pipa nas mãos. Melhor nunca ter, do que vê-la partir. Será?). 

Então eu prefiro o não dito. Ou o dito bem floreado, escondido por entre folhas secas que cheiram a alecrim e rosas brancas. O dito cifrado, deitado lá no fundo quase imperceptível, por entre as folhas alvas e o perfume doce.

Um dito que pode ser colhido em forma de beleza, para amenizar o testemunho tão frágil das palavras acabadas. O eu tão frágil que pode ser visto por olhos acordados.  O não dizer me protege, e eu finjo estar protegida. Ele me deixa só aqui nesse espaço indivisível. 

Dizer dá medo, porque existe no espaço compartilhado. Existe vulnerável, nu nesse lugar desconfortável que é estar visível para o outro. 

(Talvez eu tenha medo do outro).

Mas de vez em quando me vem a vontade de dizer. Quando o outro me aparece inteiro e cheio de possibilidades de amor, eu chego a deixar as palavras prontas na garganta. Ensaio, penso em me despir, correr, quase precisar dizer. 

E às vezes digo, lá no meio do encantamento poético com cheiro de alecrim. Às vezes sou vista no meio das árvores grandes de raízes grossas. Apareço e corro, assustada. Volto para onde tenho roupa quente, casaco, solidão protegida. Às vezes quase triste.

(O outro machuca. Esse é um segredo).  

E eu quero te dizer assim, com letras maiores e vibrantes, frases inteiras que me aqueçam e me roubem desse lugar só meu. Tanta coisa não dita que precisa ser solta. Tanta coisa quente que escorre pelos dedos, mas não alcança o teclado.  

Mas por enquanto eu só consigo encontrar flores e mais enfeites com rendas e bordados coloridos. Perfume de jasmim, dama da noite beijando o céu. 

Um sorriso com silêncio dourado e fita amarela, para que você desembrulhe e adivinhe alguns segredos contados em estrelas altas de noite aberta e lua branca. 
A foto também é minha, nascida de um desses momentos de não dizer. 

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